quinta-feira, 15 de julho de 2010

Aí, irmão, vai um pedaço?

Sempre tive o hábito de oferecer tudo que comia. Foi coisa que minha mãe, lá do interior de Minas, me ensinou quando eu tinha nove anos. Ela dizia: "Já ofereceu balinha pros colegas? Deu biscoito pra sua irmã? Esse bife é para você e para a sua prima hein!". Aprendi.

Um dia fui de férias viajar pela Bahia. Tinha passado a manhã e a tarde inteiras na praia sem comer e estava morreeeeeendo de fome! Fiz umas comprinhas (presentes pra velha) e passei naquele MacDonald´s esperto. Pedi uma promoção de BigMac pra viagem e entrei no busão pra deixar as compras no hotel.

Sentei lá no fundo do coletivo e comecei a degustar satisfeito meu sanduba. Estava mastigando feliz quando percebi olhares desejosos no banco ao lado. Não sei era paranóia infantil, mas dois branquelos maltrapilhas, mal-encarados, olhavam fixamente para a minha cara, com expressão raivosa. Pensei: putz, tão com fome e cobiçando meu Mac... e eu nem ofereci, que horror. Isso não pode. Como bom filho, fiz o que mamãe sempre ensinou:

"Aí, irmão, vai um pedaço?", perguntei, na maior boa vontade desse grande Brasil.
"Po, valeu xará, quero não", respondeu um deles.

Sei que o gesto é meio esquisito, afinal quem iria aceitar morder o sanduíche de um estranho no ônibus? Mas infância é infância, né, cara, fica no inconsciente, é quase automático.

Dois minutos depois, entendi a cara raivosa dos sujeitos. Eles estavam se preparando para uma grande cena. Foram armados para a frente do ônibus e anunciaram: "Aí, rapaziada, é assalto. Vão passando tudo ou levam bala" (e não era a balinha que eu dava pros colegas). Eu, com um pedaço enorme de batata frita na boca, quase me engasguei. Eles foram passando por todos os bancos fazendo a limpa, enquanto eu me enrolava com o Catchup, as compras, o refri e a carteira. Já ia estendendo as mercadorias e o dinheiro, quando fui interrompido com uma mão no meu peito.

"Aí, tu não, xará. Tu é parceiro. Ofereceu comida".

É isso aí gente. Desde que voltei para o Rio de Janeiro, sempre ando com comida no bolso e saio oferecendo no ônibus. Chiclete, amendoim, chololate, qualquer coisa vale. É questão de segurança. Mãe sabe o que diz...

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