quinta-feira, 29 de abril de 2010

Uma patricinha perigosa



Robertinha era a típica piriquita (nome em niteroiês para patricinha). Ficava contrariada diariamente em ter que pegar um ônibus lotado e atravessar a poça para ir do trabalho para casa. Num dia de notícias ruins no jornal, Robertinha entrou no busão com suas roupitchas Espaço Fashion, sua bolsa Victor Hugo e o óculos Ray Ban, quando uma colega, conhecida nossa, chegou sem dar nenhum aviso prévio. NEURA, aquela amiga desagradável para a qual não há remédios do tipo NEUSA... Robertinha cismou, eu quero dizer, ficou obcecada com a ideia de que naquele dia seria um alvo fácil, estava escrito nas estrelas que era realmente o seu DIA de ser assaltada.... e que absurdo! que azar! que destino miserável! viver numa cidade na qual você está sujeita a este tipo de risco o tempo todo, você, um trabalhador, uma pessoa digna... que raiva!

No meio do pensamento neurótico, eis que entra no ônibus um negão 2 metros de altura e cara de mau, e para ao lado de Robertinha, ambos em pé no coletivo. A profecia começava a se cumprir. Robertinha olhou de lado, tremeu a boca, rezou o Pai Nosso. Em fração de segundos, dito e feito. Olhou para o braço direito, o que estava encostado ao do negão, e o seu relógio Rolex havia sumido. Pronto! Aconteceu! Era fato que aconteceria! Filho da puta! Entra aqui, para do lado e rouba assim na cara de pau. O medo de Robertinha foi aos poucos se transformando num ódio por aquela criatura covarde do seu lado, pela sociedade, pelo sistema, pelo Rio de Janeiro. Mas não! Ela se recusava a ser uma vítima. Não seria uma refém! Não, não, não! Não ela! Não ia ser a sua vez, era hora de uma atitude! Roberta sussurra no canto da boca, sem olhar para o lado:

"Olha aqui, eu sei de tudo. Coloca agora esse relógio na minha bolsa, ouviu? AGORA! Você não tem ideia do que eu sou capaz"

Ouve-se a sirene. O negão sai imediatamente no próximo ponto. Roberta checa a bolsa. Um relógio preto estilo camelô havia aparecido ao lado da sua necessaire. No cotovelo, caído, esperava tranquilamente seu relógio, que como bom rolex, tinha rolado no braço com uma freiada...

Quem diria... o dia realmente era de azar... para o negão, assaltado por uma piriquita insana no ônibus, de volta do trabalho!

quarta-feira, 28 de abril de 2010

O resgate do vizinho

Entrei cambaleante em casa, depois de uma noite regada a cuba-libre e risadas com o ruivo barbudinho. Foi quase simultâneo: acendi a luz e comecei a ouvir vozes - “quediabéisso?”, indaguei-me, já que sou a única moradora de um achado imobiliário na Rua Paissandu. Era o vizinho, não de andar, mas do prédio do outro lado da rua, que gritava e gesticulava energicamente.

- Estou há hooooooras preso aqui, a porta do quarto travou. Grito, grito e ninguém parece me ouvir.

- Calma, não se preocupe que eu já desço e aviso ao seu porteiro. Peguei o Rubinho (apelido do meu elevador) para tentar resgatar o vizinho desesperado. Eis que:

- Sim, senhora, já me falaram que ele está gritando e está preso. Mas eu já cansei de tocar a campanhia e interfonar e ele não atende de jeito nenhum!

- Querido, que eu saiba ele não tem uma extensão do interfone da cozinha no quarto e, uma vez, preso, como ele vai abrir a porta? – expliquei o óbvio ao porteiro, tentanto engolir uma gargalhada que teimava em sair.

- ....

- Então, que tal arrombar a porta?

- Dona, eu não vou abrir a porta sem a autorização. A senhora não o conhece, é um criador de caso. Vai acabar sobrando pra mim. Só falando com ele e com testemunha do lado!

O jeito foi levar o porteiro, a síndica e uma vizinha curiosa até meu apartamento para que o criador de caso (?) explicasse, aos berros, que podiam arrancar a porta, escalar a janela, fazer um furo na maçaneta, o que fosse necessário para que o tirassem daquele quarto maldito. Prometeu também que se mudaria assim que possível, não queria morar num prédio com um bando de malucos. Ele nunca se mudou, mas foi salvo pelos bombeiros meia hora depois da confusão, assisti de camarote. Eu ganhei alguns pontinhos com a minha consciência, mas muitos outros com o vizinho, que me agradeceu com um pote de sorvete e até hoje me sorri através da janela do quarto na Paissandu.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Cão assassino

O nome do labrador era Zeus. Companheiro e bonzinho como todo o cão da raça. O dono, um advogado chamado Roberto, morria de amores pelo animalzinho de estimação. Os dois moravam num condomínio de casas na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, e eram a verdadeira imagem do ditado popular "O cachorro é o melhor amigo do homem".

Zeus era bem relacionado na vizinhança e costumava passear duas vezes ao dia, isso sem contar as escapulidas que dava pulando o muro baixo da casa. Volta e meia Roberto era acordado de madrugada pelos vigias do condomínio, que iam devolver o cão fujão. Todo sujo, Zeus olhava com aquela cara de pobre coitado e amolecia o coração do dono, que achava graça nas aventuras do melhor amigo e era incapaz de dar bronca no bichano.

Em uma noite dessas, Roberto deu falta de Zeus e foi atrás dele pelos arredores. Qual não foi sua surpresa quando avistou seu amigável cão com o poodle do vizinho na boca e MORTO!

Roberto não conseguia digerir a cena: como Zeus poderia ter tido tamanha maldade? Aquele poodle era chato mesmo, como todos os poodles, mas seu cachorro não tinha o perfil assassino.
O pânico deu lugar a pensamentos frios e calculistas e Roberto se viu no chuveiro de casa dando banho no cadáver. Com todo o cuidado necessário para não deixar nenhum rastro, largou a vítima lentamente no gramado do vizinho e foi dormir.

As noites seguintes foram difíceis para o advogado, que olhava desconfiado para Zeus. O animal continuava sua vida normal, sem apresentar qualquer sinal de culpa pelo crime cometido.
A amizade já não era a mesma, quando em um lindo dia de sol Roberto saía para dar sua caminhada matinal e encontrou o vizinho - dono do poodle morto por seu cachorro assassino.

O vizinho parou para cumprimentá-lo e Roberto respondeu monossilábico para que o diálogo não se estendesse. Porém, como que num desabafo, o vizinho soltou:

- Pois é Roberto, não sei se você ficou sabendo, mas nosso cãozinho morreu.

- É, fiquei sabendo. Que pena...

- É, mas ele já estava velhinho... Nós sabíamos que logo isso aconteceria. O estranho foi o que aconteceu depois.

- Depois?

- É... Ele teve uma parada cardíaca e nós o enterramos no jardim dos fundos. No dia seguinte, ele apareceu todo limpinho e cheirosinho na frente da nossa casa...

sábado, 24 de abril de 2010

Que alivio!


Viagem de férias para uma cidade do litoral do Rio de Janeiro. Que diversão. Garotada toda junta, casa enorme, festinha na cidade, praia. Essas viagens eram sempre sensacionais. Eu devia ter uns 13 anos e já curtia essas coisas.

A casa era do pai de um amigo, que, volta e meia, convidava todo pessoal da rua para passar uns dias por lá. Ela devia ter uns 6 quartos, 2 suítes, alguns banheiros e um quintal bem grande. Em um dos dias, fomos passear pela cidade. Todos juntos. Inclusive a tia e o pai do meu amigo, dono da casa. Já estávamos no caminho de volta, andando pelas ruas de terra batida da cidade, quando de repente, sem esperar, começou a bater uma vontade de ir ao banheiro. Cagar, vamos dizer assim. Por algum momento, achei de fato que daria tempo de chegar em casa tranquilamente. Engano meu. Como a vontade só aumentava, decidi apertar o passo e ir na frente. Dei alguma desculpa esdruxula para os outros, e tomei rumo.

Como era o terceiro dia, eu já sabia o caminho de volta. Então comecei a correr. Cruzei uma, duas ruas, e a distancia parecia ter aumentado naquele dia. A merda estava anunciada, literalmente. Já beliscava a cueca, quando logo avistei a casa. Corri ainda mais rápido e entrei como uma flecha pelo portão, partindo para a porta principal. Foi quando meu mundo veio abaixo. A porta estava trancada e ninguém atendia. Claro que perguntei antes se tinha alguém em casa, e disseram que sim. Mas essas coisas só acontecem quando a gente mais precisa. Não tinha jeito, tinha que liberar o material, e logo!

Não pensei duas vezes, caminhei ligeiro para o jardim da casa, e, entre a grade do jardim e um arbusto, larguei ali mesmo. E olha que saiu saindo. Neste instante, fui tomado de um alívio da porra e, ao mesmo tempo, de um desespero de saber que não podia deixar vestigios por ali. Não tinha como! Até porque nem cachorro tinha na casa pra botar a culpa.

Dei uma circulada pelo local pra pensar em como desovar o elemento. Quando, por uma clara tacada de Murphy, achei um banheiro que ficava fora da casa, do lado de trás, com a porta aberta. Não acreditava no que acabava de ver. Mas de qualquer forma, era a solução para o problema que já havia sido criado. Voltei ao local do crime, avaliei o tamanho do "problema", e procurei algumas folhas de plantas que estavam no chão. Catei algumas de mangueira, juntei-as em cima da mão, criando um tipo de luva. Peguei e rapidamente levei até o banheiro de trás (aqui vale lembrar um ponto positivo: ele estava consistente). Joguei na privada, dei descarga, um tchauzinho, e claro, lavei bastante as mãos.

Como em um golpe de sorte, voltei para frente de casa, e todos estavam chegando naquele exato momento. Cumprimentei-lhes como se nada tivesse acontecido, e continuei a curtir aqueles dias de férias. Bem mais aliviado.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Reencontro

Clara tinha a boca bem definida, carnuda na medida certa, daquelas que o sujeito olha com gula. Mas não beijava bem. Quase maldade. Havia conhecido Clara numa festa de amigos. Era gostosinha. Ficamos na vontade aquela noite, mas dias depois já estávamos nos falando e acertando o primeiro encontro. A vontade de beijá-la era proporcional à perfeição dos lábios. A conversa já me irritava até que aproximei o corpo da menina ao meu. Pronto: veio a decepção, dolorosa. Bem, eu já estava na pista mesmo. A noite rendeu um segundo encontro, aquela foda certa. Era só ligar. Esqueci de ligar. Esqueci a foda. Esqueci de dar aquela metida. Isso mesmo! Clara sumiu por alguns vários meses, numa atitude que só me restava aceitar.

Mas destino é foda (quando você não esquece de ligar). Reencontrei Clara num desses botecos do Leblon. Enquanto conversávamos, lembrava, ao mesmo tempo, do quanto beijava mal e o quanto merecia minhas sinceras desculpas. No dia seguinte, num boteco na Praia do Flamengo, estávamos juntos outra vez. O papo fluía ao som de vários chopes e algumas cachaças. O tesão só aumentava. Clara mascava um trident de melancia, em movimentos com aquela gostosa boca que me lembrava Linda Lovelace. Fomos para o meu carro, estacionado a alguns metros de uma cabine da PM e em frente a um consulado que não me recordo o país. Ali, vidros completamente transparentes, a sacanagem foi digna. Clara, em pouco tempo, já revelava um apetite voraz. O boquete era certo. E foi sensacional.

Na manhã seguinte, acordo em casa. Aquela vontade de ir ao banheiro e a memória bem debilitada. Levanto a coberta, abaixo o short para dar aquela conferida e vejo algo estranho grudado nos pentelhos. Dou mais uma olhada e descubro: era o trident de melancia, coadjuvante esquecido do sensacional boquete de Clara.

domingo, 18 de abril de 2010

O Blog


O cenário: Quatro amigos conversam num churrasquinho despretencioso regado a carne de porco meio fora da validade (leia-se estragada) e cervejinhas bem geladas. Uma piscina ao fundo, um DVD do Los Hermanos tocando... (no pequeno grupo, alguns fanáticos e outros que odeiam os barbudos, como sempre...). De repente, o ambiente de lazer e descontração vira uma terapia de grupo. Traumas infantis vêm à tona. Não se sabe se foi o porco ou a cerveja, mas a conversa ficou séria mesmo. Cada um pede a vez ansiosamente para falar, quando de repente todos param para ouvir...
O Relato: "Era verão. Tinha na minha casa duas pequenas tartarugas e uma cadela chamada Punk. Estava encantada com as filhotinhas, que eu tinha acabado de ganhar. Punk ainda não havia tomado conhecimento dos novos amiguinhos. Estávamos tentando esperar o momento certo da apresentação, quando o portal do quintal foi esquecido aberto. Um relapso fatal. Quando cheguei na casinha das bichinhas para brincar, reparei que algo estava errado: as tartarugas estavam sem casco! Aquela linda história dos seres evoluídos que levam a casa nas costas, vivem longamente e são super zen tinha se resumido a uma espécie de minhoca nojenta. E, vale destacar: sem casco!"
A consequência: Todos tentaram ficar sérios e se compadecer da dor da pobre Cristine. Mas não deu. O relato pareceu abrir as portas para uma série de histórias hilárias de situações embaraçosas, quase tão constrangedoras quanto ser uma tartaruga e de repente ficar sem casco, sem chão, sem identidade. Aí veio a ideia: por que não juntar essas histórias tragi-cômicas num blog?
A proposta: Aí está ele! E você está sendo apresentado logo de cara para evitar riscos... e mais: convidado a participar! Mande seu mico, sua história bizarra, seu relato curioso! Vamos tomar umas, comer carne (não precisa ser podre) e rir um pouco disso tudo!